Ministro Félix Fisher não suspende liminar conseguida pelo MPMG e que objetiva evitar a demolição do Cine Brasil, na cidade de Caratinga.
Segundo o Ministro: “grave lesão à ordem pública, dar-se-ia na hipótese de se permitir a demolição de imóvel antes de caracterizada ou definida nas vias ordinárias a sua importância como patrimônio.”
SUSPENSÃO DE LIMINAR E DE SENTENÇA Nº 1.654 – MG (2012/0194642-0)
RELATOR : MINISTRO PRESIDENTE DO STJ
REQUERENTE : MUNICÍPIO DE CARATINGA
ADVOGADO : ALFREDO AMARAL DE CARVALHO JÚNIOR
REQUERIDO : DESEMBARGADOR RELATOR DO AGRAVO DE INSTRUMENTO NR
8429876420128130000 DO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE MINAS GERAIS
INTERES. : MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE MINAS GERAIS E OUTROS
DECISÃO
Trata-se de pedido de suspensão dos efeitos de r. decisão concessivade liminar em ação civil pública ajuizada em primeiro grau,liminarmente mantida em sede de agravo de instrumento pelo Tribunal de Justiça do Estado Minas Gerais.
Na origem foi ajuizada “ação civil pública cautelar preparatória em defesa de patrimônio cultural” pelo Ministério Público do Estado de Minas Gerais em face do Município de Caratinga e da Distribuidora de Tecidos São Thiago Ltda., cujo pedido foi liminarmente deferido (decisão interlocutória) para:
a) suspender o Decreto Executivo nº 1363/2012, “que arquivou o processo de tombamento do imóvel” objeto da presente controvérsia, Cine Brasil;
b) suspender o alvará de licença para construção e que autoriza a demolição do mesmo imóvel;
c) “que os réus se abstenham de demolir ou praticar qualquer ato tendente à descaracterização ou demolição” do mesmo imóvel;
d) “que o Município de Caratinga se abstenha de expedir alvará para construção, reforma, demolição ou qualquer autorização no referido imóvel”;
e) antecipação de produção de prova, “consistente na elaboração de laudo técnico pericial, pelo Instituto Estadual de Patrimônio Histórico e Artístico de Minas Gerais” no intuito de responder os quesitos apresentados pelo Ministério Público. (fl. 17 – Decisão a ser suspensa/Acórdão em Agravo de Instrumento). O eminente Juiz de Direito concluiu que o imóvel Cine Brasil, além de se encontrar no plano de inventário da municipalidade, foi indicado, aprovado e tombado provisoriamente em 2009 pelo Conselho Municipal do Patrimônio Cultural de Caratinga (fl. 28). Assentou, finalmente, que na hipótese de verificada a existência dos motivos ensejadores para o tombamento, feito pelo órgão colegiado competente (Conselho Municipal), com provisão em lei municipal, o ato administrativo a ser praticado pelo Chefe do Executivo Municipal passaria a ser vinculado, não cabendo, portanto, discordância por meio de Decreto Executivo de arquivamento do procedimento administrativo de Tombamento. O e. Tribunal de Justiça entendeu por bem indeferir o efeito suspensivo ao agravo de instrumento interposto contra referida decisão interlocutória, conforme as seguintes razões: “Além da relevância das razões recursais (“fumus boni iuris”), exige-se a verificação do risco de lesão grave e de difícil reparação (“periculum in mora”) para a concessão de efeito suspensivo pleiteado. “in casu”, impõe-se negar o efeito suspensivo. Na espécie, ainda que se admita plausível a fundamentação jurídica dada à súplica recursal, não há risco de lesão grave ou de difícil reparação no se aguardar o julgamento final deste agravo, o qual, caso seja favorável à agravante, não lhe será de difícil efetivação. A se conceder o efeito requerido pela agravante, a demolição do imóvel dito como patrimônio histórico e cultural de Caratinga (“Cine Brasil”) será concluída e, obviamente, irremediavelmente frustrada
ficará a medida reclamada na ação matriz.” (fl. 18 – Decisão a ser suspensa). De acordo com o Requerente a decisão a ser suspensa “acarreta grave lesão à ordem pública e à ordem administrativa em geral” (fl. 3 -petição inicial). Para embasar a grave lesão à ordem pública/administrativa o Requerente enumera vícios de natureza processual, como a ausência de
oitiva prévia da pessoa jurídica de direito público antes do deferimento de liminar ou cautelar; de natureza procedimental concernente às irregularidades presentes em procedimento administrativo de Tombamento; de natureza constitucional, uma vez que o Poder Judiciário teria ferido a Autonomia e Independência dos Poderes ao concluir estar equivocado o arquivamento do procedimento de tombamento. Arremata ser latente a violação à ordem administrativa e ao interesse público, “uma vez que se não for suspensa a decisão ora hostilizada, o imóvel ficará impedido de ser utilizado pelo seu legítimo proprietário, com ônus negativo para o município nos aspectos financeiros e tributários, bem como na função social da propriedade, com obras ali a serem edificadas, gerando empregos, divisas e benefícios em geral para a municipalidade;” (fl. 9).
Ainda quanto à grave lesão à ordem administrativa (pública), sustenta que “não estão confluentes (…) os requisitos ensejadores do deferimento da medida liminar, notadamente o fumus boni iuris eis que não há plausibilidade do direito invocado pelo Ministério Público Estadual (…)” (fl. 3). Que a decisão a ser suspensa “padece de injuridicidade, ante a total ausência de plausibilidade do direito invocado pelo Parquet, autor da ação, daí porque a decisão ora combatida viola a ordem jurídica, a ordem administrativa e o interesse público”(fl. 9). Ao final, pleiteia o requerente a suspensão dos efeitos da decisão objeto do presente pedido.
É o relatório.
Decido.
O tema de mérito discutido na demanda principal gira em torno do Tombamento ou demolição de imóvel (Cine Brasil) considerado pelo autor da ação como patrimônio histórico e cultural de Caratinga, Minas Gerais. Deferida a liminar em sede de ação civil pública cautelar, o eminente Desembargador do e. Tribunal de Justiça do Estado de Minas Gerais ao examinar o pedido de concessão de efeito suspensivo à decisão primeva entendeu que apesar da existência de plausibilidade do direito existente, não haveria lesão grave ou de difícil reparação em se manter intacto o imóvel até o julgamento final do agravo de instrumento; entendeu, também, que a concessão de efeito suspensivo pretendido acarretaria a demolição do imóvel Cine Brasil e, portanto frustrado restaria o pedido da ação originária. Diante da manutenção, portanto, dos efeitos liminares obtidos em primeiro grau, a Municipalidade, irresignada, sustenta o seu desacerto por diversos motivos, entre eles:
– Ausência de plausibilidade do direito invocado para suspensão de decreto de arquivamento do procedimento de Tombamento e de alvará de construção e demolição do imóvel objeto da lide;
– existência de diversas irregularidades formais e materiais contidas no procedimento administrativo de Tombamento e apontadas em parecer jurídico da Procuradoria Geral de Caratinga.
– ausência de oitiva prévia antes do deferimento de liminar ou cautelar em face da pessoa jurídica de direito público e;
– inconstitucional o controle jurisdicional da atividade administrativa discricionária de arquivamento, por meio de Decreto Executivo, do procedimento administrativo de Tombamento.
O pedido não merece ser acolhido. Além de distante a solução sobre o mérito da causa principal, nítida a pretensão recursal tendente à revisão da decisão a ser suspensa, por si só incabível na via de Suspensão de Liminar. Com efeito, o pleito tendente a discutir o acerto ou não dasuspensão liminar de Decreto Executivo de arquivamento de procedimento de Tombamento não cabe nos estritos limites do pedido de suspensão e, acabaria por transformá-lo em sucedâneo recursal com intuito de modificar decisão desfavorável ao ente público. É que, nessa via, não se examina erros de julgamento ou de procedimento, cuja a análise deve se dar nas vias recursais ordinárias. Nesse sentido: AgRg na SLS 1.255/SP, Corte Especial, Rel. Min. Cesar Asfor Rocha, DJe de 14/9/2010 e AgRg na SS 1.551/AM, Corte Especial, Rel. Min. Edson Vidigal, DJ de 10/4/2006. Quanto à grave lesão à ordem pública, a alegação de que na hipótese de não ser suspensa a decisão ora objurgada, restaria impedida a utilização do imóvel por seu proprietário, não procede uma vez que não se enquadra como interesse público ou grave lesão à ordem administrativa, bens jurídicos tutelados pelo art. 4º da Lei nº 8.437/1992. Dessarte, insuscetível de tutela na via eleita. Ainda que assim não fosse, a decisão a ser suspensa se respalda na grave lesão e de difícil reparação que adviria ao bem jurídico tutelado que se pretende preservar na ação originária caso não fossem impedidos os atos tendentes à sua descaracterização, reforma ou demolição. Realmente, pela análise contida aos estreitos limites da presente via, o interesse público está presente, mas no sentido de se preservar a integridade histórica, arquitetônica ou artística do imóvel denominado Cine Brasil, ao menos até o deslinde do mérito da causa na instância ordinária. Com efeito, grave lesão à ordem pública, dar-se-ia na hipótese de se permitir a demolição de imóvel antes de caracterizada ou definida nas vias ordinárias a sua importância como patrimônio. Já em relação à grave lesão à ordem econômica, a alegação de suposta paralisação de obras que aguardam edificação e obsta a geração de empregos, divisas e benefícios e que, por conseqüência, geraria ônus financeiro e tributário à municipalidade, não restou sequer discutida, quanto mais comprovada nos autos da presente suspensão. Realmente, o Requerente sequer indicou, hipoteticamente, que obra seria realizada e qual o prejuízo acarretaria o seu retardo ao erário. De fato, a simples alegação desacompanhada de mínimo lastro probatório a comprovar grave lesão não permite a concessão da suspensão dos efeitos da decisão ora combatida. Portanto, não resta configurada ou demonstrada a lesão à ordem administrativa e econômica. Nesse sentido: “AGRAVO REGIMENTAL. SUSPENSÃO DE LIMINAR E DE SENTENÇA. CONCURSO PÚBLICO. SUSPEITAS DE IRREGULARIDADES. POSSIBILIDADE DE FRAUDE.
PEDIDO INDEFERIDO. AGRAVO REGIMENTAL IMPROVIDO. (…).
A ausência de comprovação de grave dano aos bens tutelados pela lei de regência impõe a manutenção da decisão agravada que indeferiu o pedido de suspensão da liminar. Agravo regimental improvido.”
(AgRg na SLS 1.100/PR, Corte Especial, Rel. Min. César Asfor Rocha, DJe de 4/3/2010).
Por essas razões, indefiro a pretensão suspensiva.
P. e I.
Brasília (DF), 19 de setembro de 2012.
MINISTRO FELIX FISCHER
Presidente
(Ministro FELIX FISCHER, 26/09/2012)