Promovido pelo Ministério Público do Estado do Maranhão, através da Escola Superior do Ministério Público, o Fórum de Atualização em Direito Penal e Processual Penal foi realizado nos dias 11 e 12 de setembro (quinta e sexta), no Hotel Pestana em São Luís. O evento contou com a presença de diversas autoridades, entre membros do MPMA, estudantes e profissionais do direito em geral.
A procuradora-geral de Justiça, Maria de Fátima Rodrigues Travassos, deu início aos trabalhos do Fórum. Em seu discurso, a procuradora-geral iniciou o debate sobre a globalização, ressaltando o paradoxo do desenvolvimento tecnológico que “ao mesmo tempo em que propicia riqueza à classe média, potencializa os crimes pela internet”. Fátima Travassos afirmou também que o direito penal brasileiro não mais atende às demandas da sociedade e utilizou exemplo de casos de grande repercussão, para demonstrar o sentimento de impunidade que assola a população brasileira. A procuradora destacou ainda a importância do atual contexto de reformas judiciais, no qual defendeu a constitucionalidade da Lei Maria da Penha e encerrou sua fala com a mensagem de que a comunidade jurídica não pode se acomodar diante das transformações que se mostram urgentes.
Representando o Governador Jacson Lago, o procurador do Estado do Maranhão e professor da UFMA, José Cláudio Pavão, lembrou que nunca se necessitou, como no momento atual, de tanta reflexão a respeito dos direitos e garantias fundamentais, classificando como crime qualquer ataque a esses direitos.
A primeira conferência do Fórum, Globalização e Direito Penal do Futuro, foi ministrada pelo professor de Direito Penal Comparado da Universidade da Flórida, em Orlando (EUA), Edmundo Alberto Branco de Oliveira. Pós-doutor pela Universidade Paris II (Sorbonne, França), Branco de Oliveira afirmou que um futuro novo do direito penal brasileiro depende da mudança do perfil do policial. De acordo com o professor, “o policial é a célula de uma verdadeira reforma do judiciário”. O Consultor científico da ONU relacionou o debate sobre a globalização com a reforma do judiciário brasileiro bem como as implicações envolvendo as transformações culturais e tecnológicas no âmbito do Direito Penal pelo mundo. O palestrante apontou para a necessidade de se efetivar a participação comunitária no auxílio às atividades relacionadas à área jurídica de modo geral, bem como a necessidade de se investir em ciência no campo da investigação criminal. Por fim, Edmundo concluiu afirmando que não existe área do direito que não tenha sido afetada pela globalização.
A palestra Os Novos Rumos do Sistema Penitenciário Brasileiro foi ministrada pelo professor doutor em Direito Penal pela Universidade Federal de Pernambuco e em Criminologia pela Universidade Federal de Santa Catarina, Cláudio Roberto Gabriel Guimarães. Promotor de Justiça do MPMA, Cláudio Roberto caracterizou o sistema de execução penal brasileiro como caótico, falido e defasado. O promotor apresentou dados de uma pesquisa que dirigiu, realizada no complexo penitenciário de Pedrinhas, a qual traçou o perfil da população carcerária daquele presídio. O coordenador estadual da Associação Brasileira de Professores de Ciências Penais afirmou que não existe ligação direta entre pobreza e criminalidade, mas sim entre a pobreza e a criminalização, refletindo assim a necessidade de democratização do direito penal brasileiro, a fim de destituí-lo da função de controle social das elites sobre as classes menos favorecidas.
Os Aspectos Controversos da Lei Maria da Penha foi o tema da Conferencia proferida pela promotora de Justiça do estado de Alagoas Stela Valéria Cavalcante. Mestre em Direito Público e autora do livro Violência Doméstica – Análise da Lei Maria da Penha (editora Juspodivm), Stela Valeria chamou atenção para o fato de que a violência contra a mulher não atinge somente esta, mas que também reflete sobre seus filhos. A promotora apresentou diversos exemplos de casos e de como a nova lei os enquadra.
O professor doutor em Direito pela Universidade Gama Filho, Geraldo Prado, ministrou a conferência A prova Ilícita no Direito Processual Penal. Desembargador do Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro, Geraldo comentou a respeito dos escândalos atuais envolvendo interceptações telefônicas. De acordo com o professor, as interceptações não são um meio de prova, mas sim uma técnica empregada para que as partes tenham meios de prova. “Não podem servir para antecipação dos passos de quem ainda vai cometer um crime, pois este era a técnica de controle social, utilizada nos regimes ditatoriais” afirmou. Assim, de acordo com o conferencista, “um estado democrático fundado na ética não pode se utilizar de mecanismos típicos de estados policialescos.”
A conferência “Temas Polêmicos da Reforma do tribunal do Júri” foi proferida pelo promotor de Justiça do Estado do Rio de Janeiro, doutor em Direito, pela Universidade Federal do Paraná (UFPR), Paulo Rangel. Professor adjunto de Direito Processual Penal da Universidade Estadual do Rio e Janeiro, Rangel fez duras críticas às alterações contidas na Reforma do Tribunal do Júri. De acordo com o promotor, várias mudanças não estão em harmonia com alguns pontos do Código de Processo Penal. Defendendo a necessidade de uma reforma sistêmica, ele criticou, entre outros pontos, a criação da “audiência una”, a qual julga impraticável dentre outros motivos, pelo grande número de depoimentos a serem colhidos. O professor questionou, ainda, a falta de democracia no Tribunal do Júri, que na maioria dos casos não dispõe da pluralidade necessária e criticou os legisladores por não levar em conta aspectos regionais, no que diz respeito às regras de composição.
A última conferência do evento, As Inovações trazidas pela Lei Nº 11.719/2008, ficou por conta do procurador regional da república no Distrito Federal, Eugênio Pacelli de Oliveira. Doutor em Direito pela Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), Pacelli criticou o que chamou de “processo de constitucionalização da vida” como sendo um “perigoso processo de retirada da soberania popular”. “Temos que olhar para a Constituição Federal com reservas de nosso tempo. A Constituição não é o princípio e o fim de tudo”, afirmou. O relator-geral da comissão de ante-projeto do novo Código de Processo Penal, instituída pelo Senado Federal, questionou as inúmeras sumulas editadas pelo Supremo Tribunal Federal. “O Supremo se sente no direito de sumular tudo. È a supremização do Direito”. O conferencista afirmou que no Brasil não existe um estado democrático de Direito. “Um estado democrático de direito se constitui a partir da soberania popular e da garantia dos direitos fundamentais. Nós queremos que a igualdade não seja apenas formal. Nossa Lei penal é abstração”.
Encerrando os trabalhos do fórum, a procuradora-geral de Justiça, Fátima Travassos, agradeceu a participação de todos, relacionando os nomes dos conferencistas e dos organizadores do evento. Realçando que os ensinamentos e questionamentos surgidos naquelas palestras certamente servirão para uma melhor orientação aos membros do MPMA e demais representantes da classe jurídica ali presentes, a procuradora-geral de Justiça finalizou sua fala com o convite para o I Congresso Estadual do Ministério Público do Maranhão, a ser realizado nos dias 1°, 2 e 3 de dezembro vindouro.