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Ministério Público ajuíza ação para garantir matrícula de estudante surda

Publicado em 21/01/2008 13:10 - Última atualização em 03/02/2022 17:02

O promotor de justiça Ronald Pereira dos Santos, titular da 11ª Promotoria de Justiça Especializada na Defesa dos Direitos da Pessoa com Deficiência de São Luís, está contestando judicialmente o colégio Dom Bosco por recusar a matrícula de uma estudante surda de apenas nove anos. Ele ajuizou ação civil pública com pedido de antecipação de tutela para garantir o direito da criança de estudar no estabelecimento, garantindo à família da vítima o direito de pagar o mesmo valor da mensalidade, conforme determina a Constituição Federal. O MPMA também move a ação contra o Estado do Maranhão por não fiscalizar a política estadual educacional relacionada às pessoas com deficiência.

De acordo com o texto da Constituição Federal, no artigo 6º, a educação é direito de todos e dever do Estado e da família. Deve ser promovida e incentivada com a colaboração da sociedade, “visando ao pleno desenvolvimento da pessoa, seu preparo para o exercício da cidadania e sua qualificação para o trabalho”. “Como pode uma criança com deficiência amadurecer e desenvolver plenamente suas potencialidades se não lhe é propiciada a adequada integração social, incluindo-se nesse contexto o acesso à educação, principal instrumento desse processo integrador?”, questiona o promotor de justiça Ronald Pereira dos Santos.

Ele menciona ainda o artigo 206 da Constituição, também citado no artigo 53 do Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA), que garante “igualdade de condições para o acesso e permanência na escola”. Além disso, segundo o promotor, negar à criança o direito de se matricular na rede regular de ensino é crime tipificado no artigo 8º, da Lei Federal nº 7.853.

O colégio impôs como condição indispensável à matrícula a formalização de contrato para que a família custeasse todas as despesas com a contração do intérprete de LIBRAS, que seriam somadas ao valor da mensalidade. Para o promotor, isso representa um ônus individual absurdo, ilegal e injusto, contrariando a Lei de Diretrizes e Bases da Educação, nº 9.394/96. O código determina que os sistemas de ensino assegurem aos educandos com necessidades especiais “currículos, métodos, técnicas, recursos educativos e organização específicos, para atender às suas necessidades especiais”.

Na avaliação do Ministério Público, o fato demonstra o interesse da escola em dificultar o ingresso dessa e de outras crianças com deficiência. Santos questiona a imposição de pagamento extra, como critério para efetivar a matrícula. “O princípio da isonomia impede toda e qualquer discriminação arbitrária. A atitude discriminatória da escola se configura em embaraço à educação inclusiva”, reflete.

GOVERNO DO MARANHÃO – A ação também é movida contra o governo estadual maranhense. O promotor questiona a omissão da Secretaria Estadual de Educação ao descumprir o seu papel regulador e fiscalizador da política educacional.

Segundo o promotor, o caso desta vítima é ilustrativo e demonstra como as escolas de São Luís estão se eximindo da obrigação de oferecer educação inclusiva, com recursos pedagógicos indispensáveis, o que justifica a ação contra o governo estadual. “Há flagrante omissão da Secretaria de Estado da Educação, que nada faz para garantir o efetivo acesso da criança e do adolescente com deficiência na rede regular de ensino, aí incluídas as escolas particulares”.

“Todas as escolas públicas e particulares deverão atender a todas as crianças e adolescentes, independente de sua condição física, inclusive com deficiência auditiva”. A argumentação é confirmada pela resolução nº 291/2002 do Conselho Estadual de Educação do Maranhão, que determina à escola o acolhimento de “todas as crianças, independentemente das suas condições físicas, intelectuais, sociais, emocionais, lingüísticas ou outras”, não fazendo qualquer distinção que justifique a imposição de cláusula contratual abusiva como condição à matrícula.

Outra resolução do Conselho Nacional de Educação prevê que as escolas de ensino devem prever nas classes comuns, dentre outras coisas, professores das classes comuns e da educação especial capacitados e especializados para o atendimento às necessidades dos alunos, serviços de apoio pedagógico especializado mediante atuação colaborativa de professor especializado em educação especial e atuação de professores intérpretes das linguagens e códigos aplicáveis, bem como disponibilização de outros apoios necessários à aprendizagem, à locomoção e à comunicação.

PEDIDOS – O MPMA pede que o Dom Bosco seja obrigado a matricular a criança, ou qualquer outra com deficiência, garantindo os meios necessários ao exercício da aprendizagem, incluindo instrumentos técnicos e pedagógicos, a partir do ano de 2008, desde o início das atividades escolares, a fim de evitar eventual prejuízo à formação da criança ou do adolescente. A ação pede que justiça determine a proibição de cobrança de valor adicional aos alunos com deficiência. “Não se pode ignorar a existência de indivíduos com deficiência auditiva na nossa sociedade, os quais têm garantido o direito à educação e, principalmente, à educação inclusiva”.

A promotoria pede, ainda, que a escola seja obrigada a informar ao Ministério Público e à Secretaria de Estado da Educação toda matrícula de aluno com deficiência e os recursos pedagógicos à disposição, permitindo o controle do cumprimento da liminar e que a medida seja estendida a todas as escolas da rede regular de ensino. Também solicita à justiça o prazo de 30 dias para que os colégios implantem projeto pedagógico para atender estudantes com deficiência.

ENTENDA O CASO – De acordo com a avó da garota, que cursa a 2ª série do ensino fundamental em uma escola pública, a família tenta matricular a estudante, hoje com nove anos, no colégio, desde os três anos de idade. Para justificar as constantes recusas da matrícula, a instituição alegou por várias vezes que iria contratar intérprete, garantindo futuramente a inclusão da estudante. Porém, a promessa nunca foi cumprida.

A família insistiu no pedido e em setembro de 2007 recebeu uma resposta positiva da escola. A coordenadora pedagógica informou que a matrícula havia sido deferida. Animadas com a notícia, a mãe e a avó da criança a levaram para conhecer o colégio. Entretanto, alguns dias depois foram chamadas para uma reunião com a diretora Elizabeth Rodrigues. Na ocasião, de acordo com a denúncia da avó, a diretora afirmou que só aceitaria a matrícula se a família pagasse a “bagagem”.
Ainda, segundo a avó, ao questionar o que seria “bagagem”, Elizabeth Rodrigues afirmou que a família teria de arcar com as despesas com o intérprete de LIBRAS. A avó denunciou ainda que Rodrigues afirmou que o Dom Bosco iria à falência se tivesse de arcar com as despesas para garantir acessibilidade das crianças com deficiência. “Ela alegou que a obrigação de arcar com a inclusão de crianças e adolescentes no âmbito escolar pertence ao Estado e ao município”, afirmou a denunciante.

Redação: Johelton Gomes (CCOM – MPMA)